quarta-feira, 9 de setembro de 2009

A química dos adoçantes

A química ajuda a entender e estudar a composição dos alimentos em geral e, em particular, a dos adoçantes dietéticos, para avaliar sua qualidade e estabelecer um controle nutricional e toxicológico. Assim, consegue-se atender às exigências de normas e legislações específicas, preservando a saúde dos consumidores.
Os adoçantes dietéticos de mesa são consumidos não somente por obesos ou diabéticos, mas também por um número crescente de pessoas preocupadas em manter a forma física e restringir o nível calórico de sua alimentação. Contudo, seu principal emprego é como coadjuvantes no controle do Diabetes Mellitus, uma vez que a substituição da sacarose pelos adoçantes dietéticos facilita a terapia nutricional instituída ao paciente.

De acordo com a legislação brasileira em vigor – Portaria da Secretaria de Vigilância Sanitária (SVS) nº29 de 13/01/98 –, adoçantes de mesa são os produtos especificamente formulados para conferir o sabor doce aos alimentos e bebidas.


O Codex Alimentarius, um forum internacional para normatização de alimentos, classificou os substitutos da sacarose em dois grupos:

Edulcorantes intensos ou não-nutritivos: fornecem somente doçura acentuada, não desempenham nenhuma outra função tecnológica no produto final. São pouco calóricos e utilizados em quantidades muito pequenas.


Agentes de corpo: fornecem energia e textura aos adoçantes, geralmente contêm o mesmo valor calórico da sacarose e são utilizados em quantidades que facilitam medição e o consumo do adoçante dietético.

Os adoçantes podem conter e ser formulados à base de edulcorantes naturais e/ou artificiais e seus respectivos veículos permitidos na legislação, tais como: água, álcool etílico, amido, amido modificado, dextrinas, dextrose, fruto-oligossacarídeos, frutose, glicerina ou glicerol, isomalte, lactose, maltitol e seu xarope, maltodextrina, manitol, polide
xtrose, polietileno glicol, propileno glicol, sacarose, sorbitol em pó ou solução.

Os edulcorantes são substâncias artificiais ou naturais geralmente centenas de vezes mais doces do que o açúcar de cana. Conferem o sabor doce no adoçante e não são calóricos, exceção feita ao aspartame, embora seu poder de adoçamento torne suas calorias desprezíveis. Os edulcorantes aprovados no Brasil para uso em adoçantes dietéticos são: sacarina, ciclamato, aspartame, esteviosídeo, acessulfame-K e sucralose. Na tabela 1, são mostrados os principais edulcorantes que compõem os adoçantes dietéticos pesquisados, suas características, a dose diária aceitável (IDA), o poder de adoçamento, a metabolização, a sensibilidade ao calor e ao meio ácido, as calorias por unidade e o ano de sua descoberta.

* IDA – Ingestão Diária Aceitável em miligramas de edulcorante por quilograma de massa corpórea.


A sacarina (C7H4OSO2NH) foi descoberta em 1878 por Ira Remesen e C. Fahiberg na Universidade John Hopkins - NY. Foi aprovada no Brasil como edulcorante em 1965. Apresenta sabor residual amargo em altas concentrações. É o único edulcorante estável sob aquecimento e em meio ácido. Em humanos, a sacarina é rapidamente absorvida e excretada na urina. A segurança de seu uso é investigada há 50 anos e seu uso foi permitido em 90 países.


O ciclamato (C6H13NO3S) foi descoberto em 1937, por Michael Sveda. Sua patente tornou-se propriedade dos laboratórios Abbot, que o introduziram no mercado americano depois de aprovado como edulcorante pelo FDA(o Departamento de Alimentos e Medicamntos dos Estados Unidos), em 1949, e no Brasil, em 1965. É estável durante prolongados períodos de aquecimento.

O aspartame (C14H18N2O5) foi descoberto acidentalmente em 1965 por Jim Schalatter nos laboratórios da Searle, numa época em que pesavam sobre a sacarina as suspeitas de possíveis efeitos cancerígenos e o ciclamato estava proibido nos EUA. No Brasil, o aspartame foi liberado em 1981.
O acessulfame-K (C4H4N2O4SK) foi descoberto, em 1967, na Alemanha, por Karl Clauss e Henry Jensen, acidentalmente, quando trabalhavam no desenvolvimento de novos produtos e encontraram um composto de sabor doce. Apresenta estrutura semelhante à da sacarina.

A sucralose (C12H22O12Cl2) foi descoberta em 1976 por pesquisadores da Tate & Lyle Specialty Sweeteners, na Inglaterra. É obtida pela cloração seletiva dos grupos hidroxílicos das posições 4 e 6 da sacarose. Seu dulçor é dependente de pH e temperatura, apresentando boa estabilidade.


Figura 1: Fórmulas químicas dos principais edulcorantes. Nas figuras de cima, da esquerda para a direita, aspartame, ciclamato e sacarina; nas de baixo, acessulfame e sucralose.

Em estudo realizado para a determinação de macro, micronutrientes e contaminantes em 26 amostras de adoçantes (líquido e em pó), nenhuma delas excedeu o valor recomendado para o somatório dos contaminantes inorgânicos (ASPARTAME<10 mg g-1 e SACARINA < 20 mg g-1). O consumo de adoçante dietético em pó pode interferir na digestão dos nutrientes ferro (14,2% da IDR) e magnésio (17,8% IDR). Já o consumo de adoçantes dietéticos líquidos não interfere significativamente na ingestão de nenhum dos nutrientes analisados. O valor do resíduo de cinzas nas amostras de adoçantes dietéticos sólidos analisadas está adequado à legislação, ou seja, é menor do que 4%.

Então, frente a tantas opções, como podemos responder a uma pergunta tão simples: açúcar ou adoçante?

Os nutrientes chegam ao organismo através da alimentação. Assim, a utilização dos adoçantes dietéticos soluciona algumas questões, como a diminuição da digestão calórica de pessoas que necessitam do controle da glicemia. Porém intuitivamente, ao preparar um alimento adicionando um adoçante dietético ou substituindo totalmente o açúcar por este, a dona-de-casa percebe que algumas das propriedades do alimento serão modificadas (textura, umidade, sabor, etc). Dessa forma, como garantia para o consumidor, o governo deve manter departamentos ou agências relacionadas à segurança alimentar que contemplem a agricultura, a produção e o comércio. A indústria alimentícia, independentemente do tamanho ou da origem, tem a responsabilidade fundamental de produzir alimentos seguros ao consumo.

Algumas dicas para consumir adoçantes:

Evite ingerir um excesso de produtos dietéticos (gelatinas, pudins, refrigerantes).

Consuma vários tipos de adoçantes (rodízio), inclusive os que são novos no mercado, desde que autorizados pela legislação. Se possível, utilizá-los combinados, já que assim eles possuem maior doçura, o que permite reduzir a quantidade utilizada.

Evite usar aspartame em alimentos quentes, pois, além de haver uma perda da doçura, é possível que ele seja decomposto em outras substâncias.

O uso de qualquer adoçante dietético deve ser proibido às mulheres grávidas e lactantes. Para crianças obesas, use com moderação.

Lembre-se de que todo excesso traz prejuízos à saúde. Assim, adoçantes dietéticos não fogem à regra e, portanto, devem ser consumidos com moderação.


REFERÊNCIAS:

1. MIYAGISHIMA, K. MOY,G.,MIYAGAWA, S. MOTARJEMI, Y., KÄFERSTEIN, F.K., Food Safety and Public Healyh. Food Control. 6, 5, 253-259 (1995).

2. PALAEZ V. A dinâmica Econômica da inovação no campo dos edulcorantes sintéticos. Cadernos de Ciência e Tecnologia. Brasília, 10, 1/3, 93-117 (1993).

3. BRASIL, Portaria SVS no. 29 Secretaria de Vigilância Sanitária. Diário Oficial da União de 13 de janeiro de 1998.

4. NORMAS ANALÍTICAS DO INSTITUTO ADOLFO LUTZ. Vol 1 Métodos Químicos e Físicos para analises de Alimentos.

5. FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS/ WORLD HEALTH ORGANIZATION. Codex Alimentarius Comission. Codex guidelines on nutrition labelling. CAC/GL 2-1985. Rome, 33-41 (1985).

6. LAWRANCE, J.F. Enciclopaedia of Food Science Food Technology and Nutrition , Academic Press, 3951-3952 (1993).

7. BARUFFALDI, R.; TABILE, M.N.O. Tecnologia de Alimentos Dietéticos. Módulo I: Edulcorantes, Universidade de São Paulo. Faculdade de Ciências Farmacêuticas, 57-62 (1991).
8. AGER, D. J.; PANTALEONE, D. P.; HENDENSON, S. A.;KATRITZKY,A. R.; PRAKASH,I.; WALTERS, D.E. Commercial, Synthetic Nonnutritive Sweeteners. Angew. Chem. Int., 37,1802-1817 (1998).

9. FRANZ, M. et al. Position of the American Dietetic Association : use of nutritive and nonnutritive sweeteners. Journal of The American Dietetic Association, 93, 7, 816-821 (1993). 10. CÂNDIDO, L. M. B.; CAMPOS, A M. Alimentos para Fins Especiais: Dietéticos. São Paulo: Livraria Varela, 1995.

11. PORFÍRIO, D.M. Determinação de Metais em Adoçantes Dietéticos por ICP OES, Dissertação de Mestrado, Instituto de Química, USP, 2004.Darilena Monteiro PorfírioCentro de Ciências Exatas e Naturais - UFPaElizabeth de OliveiraInstituto de Química - USP.

A química na produção de alimentos orgânicos


A ciência e a indústria químicas produzem conhecimento e insumos também para a agricultura orgânica. Embora alguns materiais publicitários e até mesmo jornalísticos a definam como sistema de produção que prescinde de química, esta se faz presente em quase todas as etapas da produção: desde o preparo do solo até a análise do produto final para verificar a ausência de fertilizantes e defensivos não permitidos nesse tipo de cultivo.
Na opinião do engenheiro agrônomo e professor emérito da Universidade Federal de Lavras, Alfredo Scheid Lopes, classificar os alimentos em orgânicos e químicos é um erro conceitual. “A própria química divide-se em dois grupos: a Química Orgânica, que estuda o carbono, o hidrogênio e o oxigênio, seus compostos e reações, e a Química Inorgânica que estuda os demais elementos. Portanto, produtos orgânicos são também químicos”, conclui Lopes.
Tanto esse tipo de produção não prescinde de química que um dos membros do grupo de insumos da Câmara Setorial de Agricultura Orgânica – órgão do Ministério da Agricultura – é o bacharel em química Wagner Polito, professor do Instituto de Química de São Carlos da USP. “Por conhecer a composição química dos materiais, o profissional dessa área pode opinar sobre o que deve ou não ser usado na agricultura orgânica”, esclarece Polito.Análises químicas de solo e folhas são constantemente utilizadas por agricultores que buscam a certificação de seus produtos orgânicos. A principal certificadora do país, o Instituto Biodinâmico (IBD), usa os laudos dessas análises para autorizar ou não o uso de determinadas substâncias bem como para verificar se o manejo da cultura foi feito de modo correto.
Os resultados de análises são usados também para determinar o tempo que o produtor levará para obter a certificação de seu produto, o que pode variar de um a cinco anos. Tão logo o agricultor decida converter sua produção convencional em orgânica, “faz-se uma análise do solo para verificar níveis de resíduos e, a partir disso, e em função de todo o levantamento da área, você faz o planejamento para conversão”, explica o engenheiro agrônomo Paulo Stringheta, professor da Universidade Federal de Viçosa.
De acordo com Stringheta, “o princípio da agricultura orgânica é cuidar do solo”. Para melhorar seu desempenho, o principal recurso é justamente a incorporação de matéria orgânica, especialmente restos vegetais e estercos. No caso destes últimos, é preciso submetê-los a um processo de compostagem para eliminar microorganismos patogênicos.
O composto é feito com camadas intercaladas de restos vegetais e esterco regadas com água. De acordo com o engenheiro agrônomo José Pedro Santiago, presidente da Câmara Setorial de Agricultura Orgânica e consultor do IBD, o esterco precisa ficar pelo menos três meses em compostagem. Durante esse período, ocorrem processos bioquímicos e a matéria orgânica é decomposta.
Polito diz que a compostagem tem ainda uma segunda função: fazer com que seja liberado carbono na forma de gás, de modo que, quando o adubo for incorporado ao solo, a relação carbono-nitrogênio na planta esteja equilibrada.Santiago explica que, para promover a fertilidade do solo, “podem também ser usados os chamados micronutrientes, que são produtos químicos”. Esse micronutrientes são combinados com matéria orgânica em insumos denominados biofertilizantes. Um deles é o Supermagro, recomendado pela Embrapa para a produção de café orgânico. Em sua composição, há água, leite e esterco bovino, e também produtos químicos como os sulfatos de cobalto e manganês e o termofosfato silício-magnesiano. Ingredientes semelhantes compõem o Agrobio, um outro biofertilizante bastante utilizado, desenvolvido pela Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado do Rio de Janeiro (Pesagro-Rio).
Santiago, contudo, faz uma ressalva sobre o emprego dos micronutrientes: “Eles podem ser usados até certa quantidade e, no caso de algumas certificadoras, é preciso justificar o uso”.
De acordo com os adeptos da produção orgânica, além de levar nutrientes às plantas, os compostos e os biofertilizantes fazem com que elas criem mecanismos próprios de defesa contra pragas e doenças, o que reduz a necessidade de usar defensivos. “O princípio da agricultura orgânica é o seguinte: tenha um solo sadio, que você vai ter uma planta sadia”, resume o presidente da Câmara Setorial.
Nos casos em que ainda assim houver pragas ameaçando a produtividade da lavoura, recorre-se a produtos como a calda sulfocálcica. Composta de polissulfetos de cálcio, ela combate ácaros, fungos e insetos. Como fungicida, também pode ser usada a calda bordalesa, preparada com cal hidratada e sulfeto de cobre. Tal como no caso dos biofertilizantes, algumas certificadoras exigem justificativa técnica acompanhada de análises de solo e folhas para autorizar o uso desses produtos.
O controle também pode ser feito com extratos de plantas como dente-de-leão, urtiga e neen. Para o professor da USP, desenvolver mecanismos que otimizem a extração e o aproveitamento desse extratos é uma função do profissional da química. “Será que o dente-de-leão não tem alguma substância que possa ser usada de modo mais rápido?”, exemplifica.
Polito também chama a atenção para a necessidade de criar meios de concentrar os princípios ativos e de desenvolver veículos eficientes para os insumos usados na agricultura orgânica. Nesse sentido, o profissional da química tem nesse tipo de produção a mesma função que exerce na convencional: criar meios de reduzir custos e aumentar a eficiência dos insumos. “Eu diria que esse campo é uma avenida aberta para pesquisa que os químicos não perceberam ainda”, opina o professor.
Escrito pela jornalista Vivian Chies, da Assessoria de Comunicação do Conselho, este texto foi publicado originalmente no Informativo CRQ-IV referente ao bimestre Julho/Agosto de 2006. A mesma edição traz outrasreportagens sobre a contribuição da química na agricultura.


Fonte: http://www.crq4.org.br/default.php?p=texto.php&c=quimica_viva__a_quimica_na_producao_de_alimentos_o